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A Universidade de Cabo Verde sempre trabalha em prol da valorização dos seus estudantes e ex-estudantes. Neste sentido, publicamos uma entrevista realizada junto com o Arlindo Nascimento Rocha, professor, pesquisador e escritor, que vive no Brasil desde 2012, onde desenvolve as suas atividades académicas e profissionais. Como ex-estudante da Universidade de Cabo Verde, partilhou conosco o seu percurso e algumas das suas ideias.

Arlindo, podes te apresentar brevemente para os nossos leitores?

O meu nome é Arlindo Nascimento Rocha, sou professor, pesquisador e escritor. A minha primeira formação académica foi no Instituto Pedagógico do Mindelo (1997/2000) e, posteriormente, na Universidade de Cabo Verde (2006/2011). Profissionalmente, iniciei as minhas atividades em 2001 como docente do Ensino Básico Integrado (EBI) no Concelho do Paul, ilha de Santo Antão, e lá permaneci entre os anos 2001 e 2005.

Além da atividade de docência, fui gestor do Pólo Educativo no 3 do Paul (Pontinha de Janela) e Supervisor do Curso de Formação de Professores a Distância do IPM. Em 2006, fui transferido para a Cidade do Mindelo e continuei as minhas funções no Pólo Educativo no 17 de São Vicente (São Pedro) e fui um dos primeiros a participar ativamente no processo da revisão curricular como docente pré-experimentador na implementação da Abordagem Por Competências (APC) nos três primeiros anos do EBI.

Atualmente vivo no Brasil (desde 2012), onde construí família e tenho vindo a desenvolver os meus estudos/pesquisas ao nível de Pós-graduação em várias universidades do país que me acolheu.          

Qual foi o teu percurso académico, em particular na Uni-CV?

O meu percurso académico na Universidade de Cabo Verde (Uni-CV) – Faculdade de Ciências Sociais e Humanas - Pólo do Mindelo, teve início em 2006, no Curso de Licenciatura em Filosofia para Docência, percurso este que foi feito em paralelo com a minha atividade de docência no EBI.

Fui um aluno aplicado, e, pelos resultados obtidos, em 2008 fui distinguido com o Prémio de Mérito pela Uni-CV. Em 2010, fui selecionado para participar do Programa de Iniciação Científica que ocorreu na Universidade Federal de Goiás (UFG) – Brasil, durante dois meses, onde desenvolvi o meu projeto de pesquisa que serviu de base para a elaboração da minha monografia de final de curso, concluído em 2011. 

Tens publicado vários artigos e produções académicas. Podes nos explicar melhor como foram desenvolvidas estas oportunidades e em que área foram focadas?

Cheguei ao Brasil em 2012, e dediquei-me quase que exclusivamente à academia. Fui aluno “especial” do Curso de Pós-graduação em Filosofia da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) durante dois semestres; fiz uma Pós-graduação (Lato Sensu), Especialização em Administração, Supervisão e Orientação Educacional e Pedagógica na Universidade Católica de Petrópolis (UCP), concluí o Mestrado em 2016 e em fevereiro de 2021 farei minha defesa de Doutorado na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).

A maior parte das minhas pesquisas e publicações estão diretamente ligadas às minhas atividades como aluno e pesquisador de Pós-graduação, Mestrado e Doutorado em Ciência da Religião pela PUC-SP e bolsista da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), uma fundação vinculada ao Ministério da Educação do Brasil.

Até o presente momento, já publiquei dez artigos em vários periódicos brasileiros, entre os quais, destaco: Revista Parlamento e Sociedade: Escola do Parlamento da Câmara Municipal de São Paulo; Revista Diversidade Religiosa PPGCR-UFPB; Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento; Revista Brasileira de Filosofia da Religião; Revista Argumentos: Departamento de Ciências Sociais, Unimontes - MG; Revista Último Andar: Cadernos de Pesquisa em Ciência da Religião); Revista Vértices: Departamento de Letras Orientais da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo.

A maior parte dos artigos foram elaborados a partir da minha dissertação de Mestrado e os outros ligados a temas relacionados com Filosofia e Ciência da Religião, Sociologia, Antropologia, Ética, Ensino Religioso, etc.  

Além desses artigos já publiquei três obras: uma pela Editora Pod – Rio de Janeiro; e duas pela Editora Viseu – Maringá (para mais informações, cf. nota no final da entrevista).

Além dessas publicações, sou colaborador do Mindel Insite (Cabo Verde) e mantenho os seguintes blogs: O Caniço Pensante; Educação, Cultura e Cidadania; Ciência(s) da(s) Religião(ões) e Oficina Académica, sendo este último, um espaço virtual para apoiar pesquisadores iniciantes com dicas e sugestões de pesquisas.   

As tuas atividades profissionais do momento são alinhadas com a tua experiência universitária, como estudante e pesquisador?

Totalmente! Pois, sou pesquisador/bolsista CAPES (integral), e considero que as minhas atividades estão todas embasadas na minha experiência como migrante, estudante (africano) em um país onde o acesso a Pós-graduação (com bolsa) de alunos nacionais (brasileiros) é cada vez mais difícil.

Graças a minha experiência profissional/académica em Cabo Verde e nas diversas universidades brasileiras, acredito que estou preparado para qualquer desafio em termos académicos desde o Ensino Básico a Pós-graduação que possa surgir, tanto no Brasil, assim como em Cabo Verde, particularmente na Uni-CV, universidade que abriu-me as portas para o mundo académico e para o conhecimento.  

Atualmente estou trabalhando em uma nova obra (a quarta) que será publicada no segundo semestre de 2021. Mas, o meu objetivo a médio prazo é fazer com que todas possam chegar a Cabo Verde por um preço acessível, pois as solicitações têm sido várias, mas as dificuldades logísticas são gigantescas...

Dirias que a tua experiência na Uni-CV foi benéfica para iniciar a tua carreira profissional no Brasil? De que maneira?

A experiência adquirida na Uni-CV foi um divisor de águas na minha vida académica posterior, pois, com a possibilidade que tive de participar do Programa de Iniciação Científica no Brasil, pude constatar o quão os nossos professores, em meio às dificuldades inerentes a uma universidade ainda em fase de implementação, esforçavam-se para levar os conteúdos da melhor forma aos alunos.

Além da experiência académica, foi uma experiência humanística, pois pude perceber que toda e qualquer dificuldade é superável, desde que os objetivos sejam claros e bem definidos. Da superação cotidiana dos alunos, professores e funcionários, trouxe comigo a tenacidade e a pujança que quem não se deixa desanimar, mesmo quando dar um passo atrás for necessário...

Que tipo de relações manténs com Cabo Verde, e com a Uni-CV em particular?

Mantenho uma relação muito boa, pois, apesar de estar fora de Cabo Verde desde 2012 e de não ter voltado desde então, não afetou em nada, pois atualmente é possível seguir tudo e todos quase que em tempo real, o que de certa forma traz certo conforto, apesar da inevitável saudade.

Após o término do meu doutorado (2021), gostaria muito de poder voltar a dar a minha contribuição como professor/pesquisador, pois, seria a realização e a retomada de um percurso iniciado há exatamente 20 anos.

Em relação à Uni-CV, tenho acompanhado pelas mídias sociais o seu desenvolvimento e engajamento cada vez mais em atividades de ensino, pesquisa e extensão, o que me alegra muito, pois sei que o caminho é longo, mas a nossa universidade está no bom caminho.

Acompanho e tenho contato com vários ex-colegas e docentes, e sei do trabalho hercúleo que estes têm vindo a desenvolver para que a Uni-CV possa, um dia, estar entre as universidades de referência a nível internacional.    

A Rede Alumni da Uni-CV tem por objetivo valorizar o percurso dos ex-estudantes da instituição. O que achas deste projeto?

Penso ser de extrema importância, pois o acompanhamento e a valorização dos ex-estudantes só pode trazer benefícios para ambas as partes. É notório que após a conclusão dos estudos na Uni-CV, muitos têm seguido percursos vários, e, em certos casos, dos que continuaram ao nível de Pós-graduação dentro ou fora da universidade e do país, alguns retornam à “casa” para dar sua contribuição.

Por outro lado, ao acompanhar o percurso dos ex-alunos (as), a Universidade tem nas suas mãos um tipo de ‘termômetro’, ou seja, um ‘instrumento’ que, certamente, serve para mensurar (avaliar) o impacto social, cultural, académico/profissional dos seus regressos; (re)avaliar as suas práticas em função dos novos desafios académicos e sociais; (re)adaptar as novas demandas do mercado empregatício; (re)definir as suas práticas de ensino e pesquisa, etc. Todos esses fatores, certamente, contribuirão para elevar a posição da Uni-CV nos rankings das universidades bem classificadas.

É um projeto que, além de valorizar os ex-estudantes, também deve ter como meta estimular outros(as) alunos(as) para que possam sentir comprometidos(as) não só a concluir o curso com sucesso, mas, que possam engajar cada vez mais em pesquisas posteriores, visando fortalecer e dar maior visibilidade não só à Uni-CV, mas à academia cabo-verdiana como um todo. Nesse sentido, todos sairão a ganhar, pois, não existe ensino sem pesquisa e pesquisa sem ensino...      

Como vês e imaginas uma relação ideal da Uni-CV com os seus ex-estudantes, em geral e para ti em particular?

Acredito que deve ser uma relação de “mão dupla”. Ambos têm as suas responsabilidades e limites e todos devem estar conscientes dos seus papeis em prol de uma universidade aberta, democrática, acolhedora, engajada, e, sobretudo, com mais qualidade de ensino e mais investimento (formação, pesquisa e extensão).

Uma vez que a Universidade dispõe-se a acompanhar os seus egressos, estes também devem estar atentos a tudo o que acontece dentro e fora da mesma, atuando não como ‘fiscalizadores(as)’, mas, como cidadãos(ães) atentos(as) às boas práticas que precisam ser estimuladas e mantidas e as não tão boas que precisam ser revistas e melhoradas.

Acredito que, só assim, poderemos construir e manter uma boa relação, e desta forma, contribuir para garantir que a Universidade, os(as) seus(as) alunos(as) e ex-alunos(as) tenham o reconhecimento não só nacional, mas, internacionalmente, atraindo assim, novos alunos, novos quadros e novos projetos...    

Algumas ideias para contribuir e valorizar a Uni-CV através do teu percurso?

Acredito que a Uni-CV está fazendo um bom percurso: afinal, acabou de completar em novembro os seus primeiros 14 anos de existência. É ainda uma “adolescente” em comparação com outras universidades centenárias. Naturalmente, as dificuldades são muitas, mas, nada que não possa ser superado com tempo, investimento, autonomia, vontade política e dedicação a causa do Ensino Superior.

Acredito que a Uni-CV deva investir na formação continuada e valorização dos seus quadros, (re)qualificação dos seus espaços (principalmente as bibliotecas e salas multimédias); estabelecer ou melhorar os convénios com universidades e pesquisadores de outros países; fomentar nos seus alunos(as) o gosto pela leitura/pesquisa; criar um fundo (monetário) e estimular os seus(as) professores(as)/pesquisadores(as) e ex-alunos(as) para que possam ter as suas pesquisas publicadas em formato impresso (nesse aspeto seria interessante investir em uma gráfica interna, exemplo de muitas universidades brasileiras); estimular e possibilitar a participação da comunidade académica em intercâmbios, congressos, eventos/grupos multidisciplinares de pesquisa nacionais e internacionais...

Acredito que muitas dessas sugestões já estão em curso, mas, nunca é demais rever e manter as boas práticas, pois, o intuito é melhorar sempre...             

Para aceder às publicações do Arlindo, entre nos links a seguir:

- Entretextos: coletânea de textos acadêmicos (2017), que resultou da sistematização de vários temas pesquisados na PUC-Rio, ligados à Filosofia Política, Religião, Ciência, Cultura e Linguagem, etc.

- Paradoxos da condição Humana: grandeza e miséria como paradoxo fundamental em Blaise Pascal (2019), uma adaptação da dissertação de Mestrado do Arlindo apresentada em 2016, sob a orientação do professor Doutor Luiz Felipe Pondé. Nela, o autor analisa conceção paradoxal da natureza humana, presente na filosofia pascaliana, em sua dimensão existencial como ser contraditório, enfatizando a relação dialética entre grandeza e miséria como paradoxo fundamental em Blaise Pascal.

- Religar-se: coletânea de breves ensaios (2020), uma obra que visa o estudo e a compreensão do ‘fenómeno’ religioso como parte do ‘fenómeno’ humano a partir do contexto sociológico, antropológico, filosófico, teológico e histórico que também resultou das  minhas pesquisas ao longo do mestrado e doutorado.

As obras também estão disponíveis em formato impresso e digital nas lojas das editoras e em várias plataformas digitais.

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